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12 junho, 2012

Experiências: Teatro II


Mais uma brincadeira com teatro, parte da mesma trama que apresentei na postagem anterior. Desta vez o diálogo entre o Rei Condenado e o Duque do Pecado.


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Duque: E onde estão seus irmãos?

Rei: À quais deles se refere?

Duque: Aos que compartilham a mesma linhagem que sua descendência. Aos não bastardos.

Rei: Não sei. De certo estão vagueando no ímpeto cego de ampliar a prole. Com eles pouco tenho em comum que não o sangue.

Duque: E a quais outros mais o termo abrange?

Rei: Os demais, do tipo que tive a chance de escolher. Imaculados pelos vícios que esta cabeça coroada herdara. Do tipo ao qual o termo se refere veladamente.

Duque: E donde vagam?

Rei: Certo distam, posso afirmar. Mas não sobre a terra. Distam no tempo. O último há mais tempo do que gostaria de lembrar. Impossível encontrar-lhes mesmo na poeira da carcaça de gusanos. Resquiem-se em livros, ou cânticos... Ainda que ambos não façam jus ao esquecimento que tenho deles.

Duque: Por que lhes fazem falta?

Rei: E não é claro?

Duque: Não...

Rei: Fato que não o é. E fato que não sei bem o porquê. Esperava que em parte alguém o soubesse. Como homens e mulheres fomos sempre tão diferentes, nunca houve um motivo semântico para tal afinidade. Mas como crianças seguíamos o mesmo ideal. E antes que perguntes-me, digo: o ideal do questionamento. Da mudança. Do não se acalentar com a rasura da razão. Éramos iguais em sede de revolução. Sonhávamos, devo dizer, com mundos perfeitos e povos instruídos; mas não sem amarrar os sonhos em ancoradouros de trabalho e parcimônia. Buscávamos o poder para implodir regimes e reconfigurar ideias.

Duque: E o que mudou? Refere-se a eles como outrem, num passado remoto, hoje distintos de si. A identificação com o passado faz de seu discurso vago... Apegado à uma paixão encarvoada.

Rei: Mudou que todos morreram. E a cada morte encarnada também desvaneceu uma ideia.

Duque: Cansou de buscar respostas?

Rei: Não. Cansei de fazer perguntas.

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