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18 fevereiro, 2009

Conto: Fulgor

O colossal exército deslocou-se rapidamente ao longo das fronteiras. Em cerca de quatro dias havia cercado toda a extensão da pequena província que pretendia invadir: uma região rica em agricultura, totalmente desprovida de defesa, e cujo relevo era de fácil locomoção. O local perfeito para se saquear ao longo de um trajeto rumo à guerra. Perfeito por demais.

Seus habitantes viviam em um regime agrário tradicional, voltado para a subsistência e auto-suficiência, fazendo com que os demais reinos vizinhos dessem pouca – ou nenhuma – importância para os eventos que ocorriam em seu interior. Ambos coexistindo com este como se toda a sua extensão fosse um grande jardim, agraciado por uma vasta beleza bucólica, digna apenas de admiração romanceada. E, portanto, irrelevante no que condizia representar um rival a ser desafiado, uma ameaça a ser exterminada ou mesmo um estorvo no meio de rotas comerciais.

Os nativos, religiosos por tradição, eram na grande maioria pessoas simples e de poucos bens materiais. Embora sempre demonstrassem uma confiança inabalável em suas crenças e uma pré-disposição nata por trabalho braçal. Viviam sob os dogmas de uma igreja segura e eficaz, que tanto servia de guia religiosa, como educadora, governante, e protetora, sob vários aspectos. Fato que muitas vezes passava despercebido por seus vizinhos.

“Afinal,” pensavam os generais do grande exército, “o que uma teocracia rural, desprovida de exércitos, poderia fazer para se defender contra um contingente tão forte e bem preparado de guerreiros?”. A resposta, não poderia ser mais seca e cruel: absolutamente NADA!

E era por isso que a religião era tão importante naquela pequena província. Por isso que o povo mantinha a devoção absoluta à sua igreja reconfortante. Por este motivo, que havia espalhados ao longo de toda a província, diversos postos de oração em forma de torre, simbolicamente chamados de “Bispos”. E por este motivo que todos os nativos, sem exceções, cultivavam um profundo respeito e louvor a seu deus. Por que se nem os camponeses e nem mesmo a igreja poderiam fazer algo para lhes proteger, então sua divindade o faria.

E ela o fez.

Como descobriu o terrível, e incomensuravelmente poderoso, exército estrangeiro, ao invadir a pequena província, com o intuito de saquear o pouco que esta poderia lhe oferecer. Nem mesmo o flanco relâmpago executado em quatro dias lhes rendeu uma vitória. Uma vitória que parecia certa, mas que nas condições que lhes foram impostas mostrou-se impossível. Pois as orações dos aldeões tiveram um efeito nunca dantes visto.

O fulgor de sua fé despertou um deus.

“E dos céus viu-se o brilho dos olhos divinos focarem-se sobre os injustos. Portando a ira absoluta, depondo a coroa dos tiranos”.

E o exército de 15.000 homens desfez-se em pó.

A Crônica do Conflito - Os eventos por trás do massacre de Eldorado dos Carajás

História em quadrinhos sobre o massacre de Eldorado dos Carajás. Roteiro: Matheus Bueno de Bueno Funfas (Eu! Hehehe...). Desenhos: André Luís. Letras: Volney Nazareno.