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25 maio, 2014

Ela

"A falta que ela me faz as vezes me sufoca, sabe? Sei que fui eu quem terminou tudo. Eu quem me afastei de propósito - ainda que relutantemente. Eu que destrocei os sonhos. Mas mesmo assim faz falta.

Não sei explicar. Achei que fosse apenas carência, apenas tesão ou só falta de companhia e cumplicidade. Mas isso vem dela, entende? É falta dela, saudades dela, do cheiro, da voz, da pele. Seus seios, seus cabelos, seu suor, seu ventre. Especificamente ela. Nada genérico.

As vezes, por impulso mesmo, eu quase ligo ou mando mensagem. Daí penso no quanto já fiz isso, e no quanto me arrependi depois. Por vários motivos: achar que estou prorrogando o improrrogável, achar que tudo isso já está morto e enterrado, achar que não há mais volta e que o certo é seguir adiante.

No fundo não vai adiantar nada. Desculpas não vão consertar as coisas. Minha saudade não vai me fazer perdoar-me pelo que passou. E as feridas que deixei, até mesmo na família dela, foram fundas além da conta. E bom, eu me desapego mais fácil. Sempre. Tenho esses momentos, mas consigo superar depois.

Se eu compartilhar isso com ela, tudo fica diferente. Nossos materiais são outros. Ela é absolutamente pura e frágil, o cristal mais transparente e delicado que já conheci na vida. E cristais devem ser guardados, mesmo que de nós mesmos. Enquanto eu sou um bloco de metal mal trabalhado, magnetizado e atraído para todas as direções possíveis, impossível de se encaixar e simetrizar harmonicamente com nada. Não fomos feitos um para o outro. Já compreendi isso, ela não.

Só queria poder dar um 'oi' de vez em quando, sabe? Dizer que lembrei do sorriso ou da voz. Ou de algo que ela gosta e que vai ser um de seus símbolos pra mim pelo resto da vida. Mas não posso.

Escolhi, como um louco suicida e masoquista, sofrer de amor. Correspondido, sim. Consumado, não. Por um capricho meu... Que não sei explicar muito bem.

Não há razão na presença ou na ausência do amor."

- do livro Crônicas de Coisas Comuns

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