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08 setembro, 2011

O Evangelho dos Mortos

Acho que este, juntamente com a coletânea Luz (Luz I e Luz II) e os trechos do Liber Anathema, este é o post mais polêmico do Astronauta.

Eu sou cristão, mas não pratico nenhuma religião e acredito que a grande maioria delas é um veneno para a humanidade. Creio que os dogmas cegam a razão e o bom senso. Mas isso não vem ao caso...

O ponto é que ontem me veio a inspiração pra escrever isso... E bom... Muitos não vão gostar deste texto... Eu praticamente gostei da dupla interpretação do texto - que poderia muito bem ser um conto de terror.


E do topo da colina eu vi. Trôpegos, caminhavam em sua marcha incansável. Atraídos pelo som trovejante da convocação. Sentindo fome de carne, sede de sangue, necessidade de alento.


Rumavam de cabeça baixa, fitando cada pisada sobrecarregada de podridão. Os olhos esbranquiçados pela inconsciência autômata que lhes guiavam. Cada qual murmurando lamúrias pessoais e íntimas. Pedidos de perdão.


Quando o trovejar soou novamente no silêncio da manhã, era como se a própria obra humana ousasse acordar Deus. Uma tentativa que apenas os motivou a caminhar com mais determinação, uma forma velada de medo e irracionalidade. Todos igualmente diferentes em suas semelhanças. Intolerantes com os que não compartilhavam seu anseio e luxúria, sua fé mundana.


E vi os cantos de suas bocas, ressecados pelas lamentações constantes de dor, se não física por conta de seu estado, espiritual em decorrência da não-vida. Viver sem mente, pois, o mesmo que estar morto.



E formando uma multidão, prostrados no sopé da colina, um a um olharam para cima. Para o último resquício de suas crenças humanas. O derradeiro e irracional motivo de sua existência. A ordem que lhes fora comandada pelo instinto mais básico do homem: a auto-preservação.



Lutariam, como sempre faziam, por um pedaço de carne e uma taça de sangue. Afiando a vaidade como arma legitimada, julgando os que devem e os que não podem se alimentar. Aconselhados pelo constante zumbir das moscas incontestáveis. Verdades que não podem ser contrariadas.


E então lhes vi subirem para o banquete. Em uníssono, proferiram o som mais nítido de sua condição: o gemido implorante por aprovação. Em seu altar, um instrumento de sacrifício e tortura, o sacerdote abateria a razão e jogaria seus restos para aqueles que a devorariam por medo e dor.


E no topo da colina, por detrás da imensa lápide oca que chamavam de templo, eu vi. Ovelhas, zumbis. Remedos de homens. Não mais do que carne e ossos sem vida própria.


E eu soube que o fim havia chegado.

Um comentário:

O Astronauta das Marés agradece profundamente pelos comentários de seus leitores. Cada interação do público com o blog me motiva, ainda mais, a postar novidades e escrever textos de qualidade. Obrigado pela força galera.

Ah, e comentários que iniciem discussões serão levados adiante, caso o assunto seja de relevância.