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17 março, 2011

Luto

Adoro a sensação trágica de se destruir algo belo.


Ana sorriu.

Como se o mundo parasse por um breve instante e o silêncio fosse a única canção, sua vida se resumiu à queda.

Os curtos cabelos dourados, adornados pela coroa do sol poente, balançaram como um poema na gentileza das brisas. A pele branca do rosto jazia corada e, apesar da intensa dor física, seus olhos de esmeralda sorriam em serenidade.

Ana morria.

O vestido branco tingiu-se de vermelho na altura dos seios. O gosto férreo anunciou o inevitável, e lágrimas caíram em profusão. O coração acelerou suicidamente sua sede derradeira.

Sob a flauta eólica e o trovão de pólvora flutuou como um anjo a filha mais pura de Deus. Por eternos segundos sangue espirrou no céu e na relva, enrubescendo nuvens e sonhos. O aroma de flores profanado pelo acre fedor de salitre e enxofre.

Terminando o arco descendente o corpo caiu no chão. O pulsar do ritmo perfeito, feito aliteração visceral. O sol cobriu-se em pesar, a terra clamou seu luto. Homens, como hienas, riram.

A pele de Ana tornou-se pálida, os lábios rubros arroxearam, os olhos vítreos opacitaram.

Ana virou cadáver e o mundo ficou mais feio. Versos perderam rimas, palavras viraram chumbo. Sentir tornou-se tédio.

Mataram a poesia.

- M.B.B.F. 17/03/2011

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