Ótimo texto da webdesigner Heloisa Biagi, do blog Fechas Aspas, sobre as verdades que a mídia massiva NUNCA vai falar sobre o RPG.
Oito anos após um assassinato ocorrido em Ouro Preto, onde uma garota de 18 anos foi esfaqueada em um suposto ritual que envolve jogos de RPG, o assunto volta à tona na mídia com mais uma tentativa de julgamento dos suspeitos.
Cercado por controvérsias, o caso, ao que tudo indica, nada mais é do que um assassinato envolvendo usuários de drogas e dívidas com traficantes (leia a explicação detalhada e os laudos periciais aqui e tire suas conclusões). Mas uma equação bombástica acabou juntando um delegado fanático religioso e um livro de RPG na casa de um dos amigos da vítima e, pronto: o espetáculo midiático jogando a culpa nos role-playing games foi armado, até mesmo como estratégia dos advogados dos suspeitos.
Não me surpreende que RPGs volta e meia sejam utilizados como bodes expiatórios para atos criminosos. Os livros enormes cheios de gravuras de monstros e criaturas míticas podem ser realmente impressionáveis aos olhares leigos. E os mais espertos, aproveitando-se da ingenuidade alheia, vendem a falsa ilusão de que um simples jogo pode ser o motivo por trás de crimes hediondos, isentando assim a culpa da má educação dada pelos pais, impunidade no país, facilidade ao acesso às drogas, falta de segurança e vigilância nos lugares públicos, entre outros fatores. Aos que buscam conforto e mostram relutância em encarar a realidade, o RPG é uma faca de cozinha próxima à cena do crime. Nesse caso, uma faca de cozinha num crime onde vítima foi baleada, vale ressaltar.
A mídia generalizada cumpre perfeitamente seu papel em crucificar os RPGs e oferecer uma solução fast-food a crimes que expõem as mazelas da sociedade. Por aqui, como jogadora de RPGs há 8 anos de ficha criminal limpa e perfeito juízo mental, me sinto na obrigação de listar algumas verdades sobre os RPGs as quais eu mesma presenciei durante todo esse tempo – e cuja divulgação a poucos interessa.
A lista:
1. RPGs estimulam o convívio social: jogar RPG, requer, no mínimo, duas pessoas: um mestre, responsável pela criação do roteiro do jogo e dos desafios, e um jogador, que deverá passar pelos desafios propostos pelo mestre. Porém, a grande maioria dos jogadores prefere grupos de 5 a 7 pessoas (ou mais) para enriquecer a história e tornar o jogo mais interessante. Reunindo-se periodicamente, os jogadores criam um compromisso com o RPG e um laço de união entre si, que geralmente transcende o script e transforma parceiros de jogo em amigos na vida real.
2. Fortalecem as noções de trabalho em equipe: ao contrário da maioria dos jogos de estratégia, no RPG não há “vencedores” ou “perdedores”, e sim jogadores que devem colaborar entre si para enfrentar as situações propostas no roteiro. Juntos, eles devem planejar estratégias, debater opiniões e tomar decisões de acordo com o consenso do grupo para que todos sejam beneficiados, desenvolvendo assim seu espírito de trabalho em grupo.
3. Aprimoram a comunicação interpessoal: nos RPGs, assim como no teatro, os jogadores “interpretam” seus personagens através da fala, da expressão e do modo de agir. Ao interpretar um personagem com traços e personalidade diferentes dos seus, o jogador experimenta novas formas de se comunicar e acaba por expandir as possibilidades da própria expressão pessoal.
4. Desenvolvem a empatia do jogador: durante a trama, um personagem passa por diversas situações que lhe afetam emocional e psicologicamente: é ferido, perde amigos e entes queridos, é recompensado, ganha aliados, exerce influência sobre outros personagens, etc. Ao interpretar as reações do personagem diante de tais situações, o jogador desenvolve sua empatia e sua capacidade de compreender os sentimentos alheios.
5. Agilizam o raciocínio: lutas, esquivas, fugas, armadilhas e enigmas são apenas alguns exemplos de desafios que fazem parte do roteiro dos RPGs. Resolvê-los requer do jogador a capacidade de pensar rápido e criar soluções para problemas e pode se tornar um verdadeiro exercício de raciocínio lógico que logo se transforma em benefícios na vida real.
6. Incentivam a criatividade: todo o enredo do jogo se passa no imaginário dos participantes. Embora os jogadores volta e meia utilizem imagens de referência e esquemas para maior compreensão do roteiro, cada jogador acaba criando uma visão das situações a partir da própria imaginação, aprimorando assim sua capacidade de conceber mentalmente cenários e ações.
7. Estimulam ambos os hemisférios do cérebro simultaneamente: ao estimular tanto o raciocínio lógico do jogador quanto sua imaginação, o RPG propicia ao jogador benefícios semelhantes aos da leitura de um livro, que desenvolve simultaneamente ambos os hemisférios do cérebro (direito e esquerdo).
8. Enriquecem o conhecimento: a história de Dungeons and Dragons, o pioneiro e um dos mais populares RPGs de todos os tempos, se passa em um mundo fantástico paralelo baseado na Idade Média e possibilita a seus jogadores a familiarização com vários aspectos da cultura medieval, como as batalhas, vestimentas, hábitos, alimentação e hierarquia social. Outros jogos como o GURPS possuem versões cujos enredos se desenvolvem nos mais variados períodos históricos, desde as Cruzadas até o descobrimento do Brasil. Para os mais jovens, o RPG tem se mostrado uma ótima forma de aliar o estudo à diversão.
9. Desestimulam a violência: ao contrário do que é noticiado, RPGs não exigem contato físico. Todas as lutas, ações, esquivas e ferimentos ocorrem na imaginação dos jogadores, e não na realidade. Até mesmo uma simples queda de braço entre personagens deve ocorrer de acordo com as regras do jogo e testes propostos pelo mestre, e não por um desafio real entre os jogadores. Logo, jogadores que por acaso utilizem agressões físicas em sessões de RPG estão subvertendo o conceito original do jogo.
10. Suas estatísticas são favoráveis: no Brasil, cerca de 7 torcedores morrem todo ano em brigas de torcida de futebol, além de centenas ficarem feridos. Anualmente, cerca de 120 pessoas viciadas em jogos de apostas entram em tratamento no Hospital das Clínicas em São Paulo. Por enquanto não se tem notícias de mortes ou atos de violência realmente comprovados entre os jogadores de RPGs. Tampouco de RPGistas que passaram por alterações de comportamento e períodos de agressividade contra amigos e parentes. O RPG é um jogo pacífico que prega a colaboração e o espírito de equipe entre seus jogadores. Portanto, não julgue um livro pela sua capa assustadora. Seu conteúdo prega valores inestimáveis à construção do caráter de um indivíduo.
Fonte: Fechas Aspas
Fico muito contente em saber que mais pessoas compartilham dessa opinião. Até agora não tenho nenhum conhecido que virou psicopata jogando RPG. Pelo contrário, boa parte dos RPGistas que conheço são inteligentíssimos e articulados.
ResponderExcluirAh sim, parabéns pelo blog. Gostei muito das suas idéias e já tá na minha lista de favoritos.
esse tipo de texto deveria ser afixado em todos os lugares.
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